Foto: Stephan Eilert/cearasc.com

O sorriso farto que sempre é companheiro e a energia contagiante são traços fáceis de se apontar quando se conversa com nossa personagem de hoje. Paradoxalmente, a seriedade em campo revela um dos motivos pelos quais citaremos conquistas tão significativas e com tamanha participação de Karen Lang Rocha, capitã das Meninas do Vozão e um dos pilares do elenco alvinegro no futebol feminino. 

O começo no futebol veio ainda na infância, em Curitiba, cidade em que nasceu e se criou. No início, jogar contra as crianças do sexo oposto era a única opção. Com a entrada na adolescência e em meio às incertezas desta fase da vida, o futebol ficou de lado, mas como em toda relação feita para acontecer, empecilho nenhum foi capaz de fazer com que Karen ficasse afastada daquilo que sempre foi sua vocação e o que mais gostava de fazer. 

“No período de transição da infância para a adolescência, eu fiquei um bom período sem jogar. Mais ou menos entre 12 e 15 anos. Muito por conta de mudanças em mim, aprendi algumas coisas erradas, mas quando voltei, o futebol me tirou de algo que, se eu não tivesse me engajado, teria feito eu me perder. Eu tinha convívio com muitos adolescentes que usavam drogas e eu me deparei com uma situação em que eu vi que poderia me dar realmente mal e, aí, algumas amigas me trouxeram de volta para o futebol e eu voltei a me dedicar ao esporte”, afirmou. 

Um novo horizonte
Quando tinha 16 anos e ainda residindo na capital paranaense, Karen teve a oportunidade de realizar o seu primeiro teste em uma equipe de futebol feminino. A partir dali, o que ainda era uma brincadeira e, por muitas vezes, um refúgio, passava a se mostrar como uma possibilidade para a vida inteira. 

“Isso é marcado na minha vida. No dia 01/05/2001, eu fui fazer meu primeiro teste em uma equipe de futebol de campo e eles disputavam muitas competições metropolitanas e intermunicipais. Foi aí que comecei a ver o futebol feminino e, depois de passar, joguei todos os campeonatos que apareceram. Também foi lá que eu conheci outras atletas que jogavam bola e isso realmente fez com que eu começasse a me focar no futebol feminino de verdade”, avaliou. 

No ano seguinte, enquanto disputava uma competição voltada para o desenvolvimento do futebol feminino no sul do país, Karen recebeu o convite para realizar um período de avaliação no Santos Futebol Clube. Ainda que aquele fosse um enorme passo para a realização do sonho da profissionalização no futebol, havia uma boa parte do caminho a ser percorrido e, nesse momento, a firmeza de uma das referências de vida de Karen foi fundamental para que ela desse continuidade à construção da carreira vitoriosa que conhecemos hoje. 

“Quando me chamaram para ir fazer o teste no Santos, minha família não queria que eu fosse embora. Mesmo com a maioria das pessoas ‘contra’, quem bateu o martelo foi minha mãe. Ela me perguntou se era o que eu queria e disse que eu iria. Foi aí que eu passei no teste do Santos e comecei minha carreira profissional”, pontuou. 

Como em todo começo, as dificuldades e a saudade da família eram companhias indigestas, mas sempre presentes naquele período da vida de Karen. Ainda que de maneira complicada, tudo foi tirado como aprendizado e, como recompensa à resiliência, a atleta chegou àquele que é o maior desejo de todo atleta de alto nível: a seleção de seu país. 

“Já no Santos, passei por alguns perrengues financeiros, o futebol feminino ainda era pouco valorizado e foi uma época em que eu realmente encontrei dificuldades, mas em que eu pensava que não poderia voltar atrás em nada, porque estava atrás do meu sonho. Já na primeira competição, fomos campeãs paulistas e pouco depois as coisas começaram a acontecer. Em 2004, fui convocada para uma seleção paulistana e a gente jogou contra a Seleção Brasileira que jogou as olimpíadas de Atenas. Eu joguei bem, o treinador Renê Simões me viu e aí fui chamada para a Seleção Brasileira Sub-19 que iria jogar o mundial”, contou. 

Vivendo um sonho
Já como atleta da Seleção Brasileira de base, Karen pôde experimentar as mais diversas sensações que um atleta de alto nível tem acesso. Praticamente dedicando-se somente àquilo, a zagueira vivia ali o melhor momento de sua vida, profissionalmente falando. 

“Quando eu tive meus primeiros contatos com a Seleção Brasileira e com a CBF, realmente senti prazer em viver tudo aquilo que o futebol me proporcionava. Ali a gente se sentia realmente valorizada. Tínhamos absolutamente tudo. Depois do mundial da Tailândia, em que ficamos em quarto lugar, já fui integrada à seleção principal”, citou.

Medalha Pan-Americana
Poucos sonhos são mais significativos para um atleta do que aquele de subir ao pódio em uma competição da magnitude de um Pan. Em 2011, Karen jogava pelo Duque  de Caxias/RJ, e teve a oportunidade de disputar o Pan-Americano de Guadalajara, no México.

Em uma campanha em que foi titular durante todo o campeonato, a zagueira contribuiu para que a delegação brasileira trouxesse a medalha de prata na bagagem. Na decisão, nossa seleção parou nos pênaltis contra o Canadá, algo que não ofuscou o desempenho coletivo da equipe e, muito menos, o individual de Karen. 

“Eu joguei e fui titular em todos os jogos do Pan-Americano. Sem dúvidas, aquele foi o melhor período da minha vida. Infelizmente perdemos nos pênaltis pro Canadá, mas foi sensacional”, salientou. 

Carreira militar 
Já com uma carreira consolidada e com mais de 10 anos de profissional do futebol, Karen resolveu aceitar um convite que mudaria muito em sua vida. Depois de um período no futebol paulista, a atleta migrou na Marinha do Brasil para ser atleta da equipe das forças armadas navais de nosso pais. 

Após um período de adaptação à nova casa, Karen cresceu dentro da instituição e realizou tudo isso em paralelo ao futebol e às lutas necessárias para o crescimento pessoal e da modalidade no cenário nacional. 

“Em 2012, eu tinha acabado de disputar o Pan-Americano e de ganhar duas Copas do Brasil e o Campeonato Paulista e optei por ir para a Marinha. Lá, minha experiência foi de uma parte complicada para uma fase boa. A primeira coisa que tive de aprender foi a ter mais disciplina e a respeitar mais as pessoas que estavam acima de mim. Foi importante porque isso moldou muito do meu caráter. Nesse período, também tive de confrontar muita gente para que tivéssemos as coisas e graças a Deus, nos meus últimos anos de Marinha, tudo caminhou, um novo comandante chegou e as coisas realmente mudaram para melhor”, disse. 

Chegada ao Mais Querido 
Ao todo, foram quase oito anos como atleta da Marinha e quis a vida que Karen chegasse ao Vozão em 2020. 

Já são quase dois anos como atleta do Mais Querido e o sonho pessoal e do clube para a modalidade ainda se mantém. Não restam dúvidas de que a mentalidade e o vigor da capitã das Meninas do Vozão têm sido e permanecerão sendo fundamentais para a evolução da modalidade em Porangabuçu e para que as chances do objetivo se tornar realidade sigam aumentando

“Eu ainda tenho muito o que realizar aqui no Ceará. Eu quero muito subir esse time para a primeira divisão, depois ser campeã de grandes coisas porque eu já fiz isso e, mesmo sabendo que é difícil, sei que é possível. Eu sei que estou perto de encerrar a carreira, mas eu quero que isso aconteça comigo fazendo história. Eu estou aqui para criar raízes dentro do Ceará”, finalizou. 

A verdade que é emanada em meio às palavras ditas por Karen faz com que acreditemos que tudo é possível para o Alvinegro em meio aos desafios que se aproximam. Tomando como exemplo a capitã do time, percebemos que, por mais difíceis que as coisas possam parecer, uma vez que o destino está traçado para que as coisas aconteçam, nem mesmo um caminho árduo é capaz de atrapalhar a chegada.

 Matheus Pereira/Departamento de Comunicação - CSC